Bullying pode trazer graves consequências para o futuro

Apelidos e chacotas podem não ser tão inocentes assim. “Magrelos”, “gordinhos” e “feios” que o digam. Quando o cenário faz surgir um quadro psicológico repressor, é bom abrir o olho e verificar se o bullying ganhou terreno.

O bullying (do inglês bully = valentão, brigão) descreve comportamentos com diversos níveis de violência, que vão desde as chateações inoportunas até episódios abertamente agressivos, verbais ou não, intencionais e repetidos, sem motivação aparente, provocados por uma pessoa ou um grupo em relação a outras. Causa dor, humilhação, discriminação. Não é à toa que a literatura especializada também adota o termo vitimização para quem é alvo da prática.

A expressão é cada vez mais comum no cotidiano das escolas mundo afora, embora também possa acontecer em qualquer outro contexto social (vizinhança, local de trabalho, forças armadas, etc).

Só para se ter uma ideia, no Brasil, três em cada 10 estudantes afirma ter sido vítima de bullying, segundo a última edição da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada em 2009. A PeNSE também revelou que a prática é mais frequente entre os escolares do sexo masculino (32,6%) do que entre os escolares do sexo feminino (28,3%). A ocorrência é verificada em maior proporção em escolas privadas (35,9%) do que em escolas públicas (29,5%).

Consequências:
De acordo com o psicólogo Marcos Uriostes, as consequências são basicamente duas: física e emocional. “A personalidade de cada um já é resultado dos modos de interação com a família, a sociedade, e as referências que daí surgem e vão nos formando. Imagine então o transtorno causado por uma ação, como o bullying, que já tem a característica da deformação propriamente dita? Quem passa por isso pode ter diversos problemas, desde a evasão da escola até a intimidação no relacionamento inter-pessoal”, explica.

A psicopedagoga Edivoneide Andrade dos Santos indica que, com o tempo, a vítima tende a se sentir solitária, excluída do contexto. “Há reflexos negativos no processo de socialização e aprendizagem, bem como na saúde física e emocional. O pior é nos casos em que a pessoa vai se isolando, o que compromete a estruturação da personalidade e a autoestima, além da falta de certeza de se estar em um ambiente educativo seguro”.

A escola não deve admitir esse comportamento e deve tratá-lo como assunto sério. Caso torne-se ameaça à integridade física e moral, deve-se inclusive denunciar à Vara da Infância e Juventude mais próxima, para que os episódios não continuem acontecendo e denegrindo a integridade da criança agredida.

“Os pais também devem estar atentos ao comportamento dos filhos, se está normal ou diferente. Caso mude, caso a criança fique inibida, os pais devem conversar com jeito, entrar no mundo do filho para descobrir o que há e buscar as medidas cabíveis, de modo diplomático e efetivo”, complementa Edivoneide. 

Testemunho:
A jovem jornalista Ariane Fonseca foi vítima de bullying entre os 7 e os 11 anos, aproximadamente. De família humilde, morava em uma cidade do interior de São Paulo, tinha roupas simples e ainda usava um óculos no estilo “fundo de garrafa”. 

“Ninguém queria papo comigo, as meninas não me aceitavam. Esse era um problema que eu tentava compensar estudando, para alguém me dar atenção de alguma forma. Mas o tiro saiu pela culatra. Os professores gostavam de mim, mas a situação com os colegas piorou, porque eles achavam que eu ‘puxava saco’, queria me sobressair”, conta.

Um dos episódios que mais marcou foi quando uma das meninas mais “patricinhas” do colégio entrou no banheiro, arrancou os óculos do rosto de Ariane e pisoteou-os, sem motivo algum. Apesar de sofrer com a situação, ela evitava contar os episódios para os pais com medo de a exclusão aumentar, pois os pais poderiam levar o problema até a escola.

No entanto, ela não aconselha ninguém a manter silêncio. Sofrer calado não é a melhor opção, pois muito do que se sofre nesse período de formação humana ganha maior proporção no futuro. A jovem aconselha a busca de um profissional e não ter vergonha de falar com os pais.

“Na infância, eu não tinha muita noção do que isso causaria na minha vida hoje. Por exemplo, eu me cobro demais pelo estudo, de ser sempre boa, inteligente. Também tenho um certo problema com críticas, especialmente nos estudos, já que eles foram minha válvula de escape contra o bullying. Se ninguém me via como ‘bonitinha’, ao menos me viam como a ‘inteligente’. Também tenho necessidade de aceitação por parte das outras pessoas, tanto que muitas vezes desagrado a mim mesma tentando agradar os outros”, explica.

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